Golfinhos híbridos: simples curiosidade ou uma má notícia?

O pequeno e esguio golfinho-clímene (Stenella clymene) pode ser um indicador da saúde dos oceanos, já que recentemente foi classificado como o primeiro mamífero marinho híbrido do mundo.

Uma análise molecular, detalhada em estudo publicado na última edição da revista PLoS ONE, concluiu que os golfinhos-clímene, que vivem no Oceano Atlântico e podem medir até 2,10m de comprimento, são fruto do cruzamento entre dois parentes próximos: os golfinhos-rotadores (Stenella longirostris) e os golfinhos-listrados (Stenella coeruleoalba).

“Na maioria dos casos, os indivíduos favorecem a própria espécie quando acasalam”, explica a pesquisadora Ana Amaral, da Universidade de Lisboa. “Para que essas três espécies de golfinhos preservem sua diversidade genética, elas devem acasalar preferencialmente com membros de sua espécie”.

Mesmo assim, alguma coisa impeliu os listrados e rotadores a se reproduzir entre si, gerando o golfinho-clímene. É como se um ser humano escolhesse se acasalar com um chimpanzé, e o fruto desse cruzamento representasse uma espécie totalmente nova.

Evidências sugerem que houve um cruzamento entre um segmento da nossa espécie e os neandertais, já que seu DNA está presente no genoma de humanos não-africanos, mas esses hominídeos foram simplesmente absorvidos pelo Homo sapiens.

Já o golfinho-clímene seria uma espécie distinta dos golfinhos-rotadores e listrados. Segundo o estudo, a análise do DNA revela que seu genoma mitocondrial é mais parecido com o do golfinho-listrado. Já o genoma nuclear se assemelha mais ao do golfinho-rotador.

As duas espécies originais nem sequer se parecem, o que torna o acasalamento híbrido ainda mais surpreendente.

“Fisicamente, eles têm cores variadas e seus crânios têm formas e tamanhos diferentes”, explica a pesquisadora. “No entanto, essas diferenças não impedem que os golfinhos se acasalem e produzam híbridos férteis”.

Golfinho-rotator

Golfinho-rotator

Golfinho-listrado

Golfinho-listrado

 

Híbridos que ocorrem naturalmente não são raros entre plantas, peixes e aves – e não é por que são mais sensuais. Isso se deve a fatores genéticos e embrionários, que tendem a impedir que os mamíferos gerem filhotes híbridos viáveis.

Ao que parece, os cruzamentos entre golfinhos-listrados e rotadores está acontecendo há anos e em grande número, o suficiente para produzir uma nova população de golfinhos-clímene.

“Não está claro se a redução das populações estimulou a hibridização”, explica Amaral. “Pode haver outros fatores que contribuem para o fenômeno, como a necessidade de explorar novos habitats com novos recursos”.

Se as atividades humanas afetaram o habitat original e a disponibilidade de alimento dos golfinhos, talvez sejamos parcialmente responsáveis por essa hibridização.

Golfinho-clímene: híbrido

Golfinho-clímene: híbrido

Sabe-se que ambas as espécies são vulneráveis à captura acidental em redes de pesca. Elas também são caçadas para consumo humano ou como isca para tubarões. A poluição, a perda do habitat e a mudança climática também são fatores de risco.

Portanto, ainda não sabemos se o surgimento dos golfinhos-clímene é uma boa ou uma má notícia para os ecossistemas marinhos. “Sabemos muito pouco sobre o golfinho-clímene, cujo nome científico se traduz como ‘oceânide’, mas que ironicamente também significa ‘fama’ ou ‘notoriedade’”, afirma Howard Rosenbaum, diretor do Programa Gigantes do Oceano da Wildlife Conservation Society.

Novas pesquisas poderão confirmar se o golfinho-clímene ganhará fama por ser uma novidade entre os mamíferos marinhos, ou notoriedade por demonstrar que suas populações estão ameaçadas.

[Animal Planet]