Arsênico de minas de cobre do Chile foi encontrado no gelo da Antártida

É um mundo pequeno, afinal. Deixando de lado os exercícios filosóficos de borboletas e tempestades, mudanças de condições em uma área do mundo podem, e o fazem, afetar locais a milhares de km de distância. A poeira do deserto do Saara fertiliza a Amazônia, a poluição atmosférica nas cidades chinesas aumenta inundações nas zonas rurais muito mais distantes, e o aumento das temperaturas e o derretimento das calotas polares estão forçando a subida do nível do mar nas zonas em lugares longe de geleiras. Um novo estudo acrescenta outro item à lista.

Em um artigo publicado na revista Atmospheric Environment, os pesquisadores descrevem como eles foram capazes de rastrear o surgimento da indústria de cobre do Chile, analisando camadas de gelo na Antártida, a mais de 6400 km de distância. Outros poluentes provenientes de atividades humanas distantes já foram detectados na Antártida, mas estes depósitos têm uma história interessante para contar.

Como o arsênico chegou lá? O arsênico é um elemento que ocorre naturalmente, mas é altamente tóxico, e muitas vezes mostra-se nas mesmas formações geológicas como outro recurso valioso – cobre. Mas cobre misturado com arsênico não vende tão bem como o cobre puro. Assim, durante anos os mineiros tiveram que extrair arsênico do minério de cobre através primeiro da  lixiviação com produtos químicos ou fundição, e depois aquecendo-o de modo que tudo o que resta é o metal desejado. Neste caso, o arsênico é liberado para a atmosfera, onde se mistura com o ar e eventualmente cai do céu como chuva – mesmo em uma área tão distante do local original como a Antártica. Muitos depósitos de cobre no Chile têm lidado com arsênico por anos, já que a indústria decolou no século 20.2225182[1]

No estudo, os pesquisadores examinaram núcleos de gelo tirados da Antártida e mediram a quantidade de arsênico em cada camada. Em cada núcleo de gelo tirado, as camadas representam um registro natural que se estende de 1883 a 2008. Eles descobriram que antes de 1900, os níveis de arsênico eram bastante baixos, medindo 1,92 picogramas por grama. Mas os pesquisadores notaram que houve um aumento nos níveis de arsênico logo após a indústria do cobre realmente decolar no Chile na década de 1940. Em 1950, a taxa tinha aumentado para 7,94 picogramas por grama. Então, na década de 1990, o governo chileno começou a criar regulamentações ambientais detalhadas que reduziram a liberação de arsênico na atmosfera. Após as novas orientações entrarem em vigor, os níveis de arsênico na Antártida caíram de volta aos níveis pré-1900.

Esses são números totais bastante baixos. Para efeito de comparação, a Organização Mundial de Saúde define o limite seguro de arsênico na água potável em 10 microgramas por litro. Com um milhão de picogramas em um micrograma e cerca de 1000 gramas de água em um litro (ressalva: não, gelo e água não são a mesma densidade pois o gelo tende a ser menos denso que a água, mas pode ajudá-lo a colocar os números em perspectiva), até mesmo os mais altos níveis da camada de gelo de 1950 da Antártida é considerado bem dentro dos limites aceitáveis. Mas isso não é o fim da história. Enquanto o gelo da Antártida pode estar ok (nesta questão, pelo menos), as outras áreas podem não ter a mesma sorte.

Franciele Schwanck, autora principal do artigo disse ao jornal chileno La Tercera que era provável que a maior parte do arsênico caiu do céu muito antes de ter alcançado a Antártica, criando um potencial perigo para a saúde pública em áreas do Chile, que estão mais próximas das minas de cobre.